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SUS oferece remédio para doença rara, mas limita a distribuição

Patrícia Pasquini


Após incorporar ao SUS o medicamento de alto custo nusinersena (Spinraza), para tratamento da AME (atrofia muscular espinhal), o Ministério da Saúde afirmou que, dos pacientes portadores do tipo 1—são três, ao todo—, apenas 370, em todo o país serão contemplados com tratamento com o remédio.

Segundo estimativas da Associação Unidos pela Cura da AME, sediada em São Paulo, cerca de mil pessoas, entre crianças e adultos, precisam do medicamento. Cerca de 60% deles têm o tipo 1. Do total de associados, 40% já fazem uso do Spinraza por meio de liminar concedida pela Justiça. 

Entre os 370 que receberão o medicamento, estão pessoas que o obtiveram por demanda judicial, e também os casos de pedidos feitos diretamente ao ministério. 

À Folha, o secretário de Ciência e Tecnologia do Ministério da Saúde, Denizar Vianna, confirmou a medida. 


O Spinraza revelou resultados considerados surpreendentes na melhora do quadro de pessoas com AME. A do tipo 1 é considerada uma das formas mais graves da doença e a mais comum.
As doses são aplicadas durante dois anos —seis no primeiro ano e três no segundo. A dosagem é feita diretamente na medula com intervalos de 14, 28 e 60 dias.

Vianna diz que o primeiro lote do remédio, com 300 frascos, em breve será distribuído aos estados, mas não deu prazo. Segundo ele, se a demanda for maior e chegar a 420 pessoas, a pasta disponibilizará o Spinraza pela nova modalidade de compra denominada compartilhamento de risco com a indústria.


Isso quer dizer que o governo só arcará com os custos se a melhora do paciente for comprovada, com a evolução da função motora e o menor tempo de uso de ventilação mecânica. “Se ultrapassar 420, vamos rediscutir o modelo de distribuição”, afirma.

O mesmo processo deve ocorrer com quem possui os tipos 2 e 3 da doença, também sem prazo determinado.

Além da medicação, o ministério afirma que vai oferecer acompanhamento e tratamento multidisciplinar. “Queremos nos certificar de que o paciente tenha acesso a linha de cuidados dentro dos centros de referência presentes nos estados”, diz.

Quando a Folha questionou o secretário a respeito do volume maior da demanda de pacientes, a assessoria de imprensa do ministério solicitou o encerramento da entrevista.

Gianlucca Trevellin, 7, é filho do presidente da associação, o comerciante Renato Trevellin, 42. Ele tem AME tipo 1.

“No segundo mês de vida, comecei a perceber que ele não segurava o pescoço, tinha tremor na língua e não levantava o braço. Os médicos diziam que era normal. Com oito meses, o problema se agravou e veio a dificuldade respiratória. Foram dois meses de internação e vários exames, mas o diagnóstico da doença saiu após a realização de um teste de DNA”, relata o pai.

Em março de 2017, a família entrou na Justiça para a obtenção do remédio e obteve parecer favorável. Porém, o ministério só cumpriu a ordem um ano depois, sob ameaça de prisão de um membro da pasta.

De acordo com a associação, hoje, a dose do Spinraza custa cerca de R$ 300 mil para a compra direta, mas para o governo atender as demandas judiciais o valor cai para R$ 220 mil. Com a incorporação ao SUS, a dose sairá por R$ 147 mil, em média.

O médico Marcus Yu Bin Pai, fisiatra, especialista em dor e reabilitação, e pesquisador do Departamento de Neurologia do Hospital das Clínicas de SP explica que o diagnóstico da AME deve ser rápido e o início do tratamento imediato. 

“O Spiranza estabiliza o quadro da AME tipo 1 ou permite uma leve evolução, ajudando a evitar a morte e proporcionando qualidade de vida, mas ele não age sozinho. O remédio é só um reforço para que o músculo funcione. O paciente precisa do tratamento multidisciplinar com fisioterapia motora e respiratória”.

Com o diagnóstico do filho em mãos, Renato Trevellin correu contra o tempo. Sua dedicação foi fundamental para a aprovação do Spinraza no Brasil.

 “Em 2013, comecei a busca pelo que poderia ser feito e a acompanhar os testes do medicamento feitos nos EUA. Fiz muitos contatos com pais cujos filhos estavam participando destes testes. A minha esperança aumentou”, diz.

Engajado, Trevellin participou de uma campanha para a aprovação do remédio nos EUA, o que ocorreu em dezembro de 2016, e depois no Brasil. A associação que preside foi criada no mesmo ano para dar força ao movimento.

“Cada etapa da luta demorou meses. De 2016 até agora já fui 20 vezes a Brasília e estive em mais de 40 reuniões pela aprovação e incorporação do remédio ao SUS”, afirma.

Para ter acesso ao Spinraza, os pais ou responsáveis pelo paciente com diagnóstico de AME tipo 1 devem ir até uma farmácia de alto custo, administrada pelas secretarias estaduais de Saúde, com o laudo e a prescrição médica, para o tratamento. 

Portadora da AME tipo 2, Heloísa Batista de Lucena, 5, pratica natação. A mãe, a dona de casa Cibele Batista de Lucena, 25, do Grajaú (zona sul), comemora os benefícios do medicamento. 

“A partir da segunda dose houve melhora da postura e ela conseguiu levantar os bracinhos. A partir da terceira andou sem apoio. Agora, ela só usa o respirador para dormir e está fazendo exames para saber se precisará continuar com o aparelho. O que mais me surpreendeu foi o fato da minha filha conseguir nadar”, diz.

Com um ano e três meses, Heloísa começou a demonstrar fraqueza muscular, mas a doença só foi descoberta oito meses depois. 

Heloísa recebe a medicação graças a uma liminar da Justiça concedida em novembro do ano passado. A aplicação foi iniciada somente sete meses depois e é feita na Santa Casa de Lorena (a 198 km de SP).

Atualmente, ela está na quarta dose. A família, cuja renda é de pouco mais de um salário mínimo (R$ 998), arca com os custos do procedimento e do deslocamento até Lorena, cerca de R$ 4.000. 

“A disponibilidade do Spinraza é a melhor notícia que uma mãe pode ter. Espero que o medicamento não falte a ninguém”.

AME (Atrofia Muscular Espinhal)

Doença rara, neurodegenerativa com predominância genética, se dá pela alteração de um gene dos pais
A chance de acometimento é de 25% para cada filho 
No mundo, a cada 10 mil crianças, uma é acometida pela doença

Sintomas
Perda de força e firmeza muscular nas mãos, braços e pernas;
Na segunda fase, atinge a coluna;
Num terceiro momento, acomete os músculos respiratórios e diafragma; a criança tem dificuldade para respirar e deglutir

Tratamento
Multidisciplinar, com terapia motora e respiratória, e medicamentoso (Spiranza)

Fonte: Marcus Yu Bin Pai, médico pesquisador do Hospital das Clínicas