Cientistas tomaram outro passo importante para compreender como apenas enfiar agulhas no corpo pode aliviar a dor.
Em um artigo recentemente publicado na conceituada revista científica Nature Neuroscience, uma equipe de cientistas da Universidade de Rochester Medical Center identificou a molécula adenosina como uma peça central importante para alguns dos efeitos analgésicos da acupuntura em nosso organismo.
Com essa descoberta dos efeitos da adenosina, os cientistas foram capazes de triplicar os efeitos benéficos da acupuntura em ratos, com a adição de um medicamento aprovado para tratar a leucemia em pessoas, demonstrando que a adenosina pode participar do mecanismo de ação da acupuntura.
A pesquisa focou na adenosina, um composto natural, conhecido por seu papel na regulação do sono, pelos seus efeitos sobre o coração e por suas propriedades anti-inflamatórias. Além disso, a adenosina também atua como um analgésico natural, tornando-se ativa na pele após um ferimento para inibir os sinais nervosos nociceptivos e aliviar a dor de uma forma semelhante à lidocaína (um medicamento anestésico).
No estudo, os cientistas encontraram que a adenosina é também muito ativa nos tecidos mais profundos afetados pela acupuntura.
Os pesquisadores de Rochester analisaram os efeitos da acupuntura no sistema nervoso periférico – os nervos em nosso corpo que não fazem parte do cérebro e da medula espinhal. A pesquisa complementa outros estudos recentes e bem estabelecidos que demonstraram a acupuntura pode atuar no sistema nervoso central, resultando em sinais que levam o cérebro a produzir endorfinas naturais com efeitos analgésicos.
Segundo o neurocientista Maiken Nedegaard, que liderou a pesquisa, as novas descobertas adicionam importante peso científico à acupuntura. Sua equipe apresentou o trabalho em um importante congresso em Barcelona, na Espanha.
“A acupuntura tem sido utilizada como tratamento médico em certas partes do mundo por 4.000 anos, mas como ela ainda não é compreendida completamente, muitas pessoas tem permanecido céticas”, disse Nedergaard, co-diretor do University’s Center for Translational Neuromedicine, onde a pesquisa foi realizada.
“Neste trabalho, nós fornecemos informações sobre um mecanismo físico através do qual acupuntura reduz a dor no corpo,” acrescentou.
Para realizar o experimento, a equipe realizou tratamentos de acupuntura em ratos que tiveram desconforto em uma pata. Os ratos cada receberam um tratamento de acupuntura de 30 minutos, com a agulha aplicada em um conhecido ponto de acupuntura perto do joelho, com agulhas muito finas, manipuladas suavemente a cada cinco minutos, simulando o procedimento realizado em pacientes humanos clinicamente.
A equipe de cientistas fez uma série de observações sobre a adenosina:
- Em ratos com níveis normais de funcionamento de adenosina, acupuntura reduziu o nível de desconforto em dois terços.
- Em ratos especiais que não tinham receptores da adenosina, a acupuntura não apresentou efeitos analgésicos.
- Quando a adenosina foi ativada nos tecidos, o desconforto foi reduzido mesmo sem acupuntura.
- Durante e imediatamente após um tratamento de acupunctura, o nível de adenosina nos tecidos próximo das agulhas era 24 vezes maior do que antes do tratamento.
Assim que os cientistas reconheceram papel da adenosina, a equipe explorou os efeitos de uma droga utilizada no tratamento de câncer chamado deoxycoformycin, que torna mais difícil para o tecido remover a adenosina. O composto impulsionou os efeitos do tratamento de acupuntura drasticamente, quase triplicando o acúmulo de adenosina nos músculos e mais do que triplicando o comprimento de tempo que o tratamento foi eficaz.
“É claro que a acupuntura pode ativar um número de diferentes mecanismos,” disse Josephine P. Briggs, M.D., diretor do Centro Nacional para Medicina Complementar e Alternativa do National Institutes of Health. “Este estudo cuidadosamente realizado identifica a adenosina como uma nova peça importante no processo. É uma interessante contribuição para nossa crescente compreensão da intervenção complexa que é a acupuntura,” acrescentou Briggs.
O trabalho é “um estudo de referência“ que foi “muito meticulosamente feito, com uma hipótese muito clara que foi avaliada em muitos níveis diferentes,” diz Vitaly Napadow, um neurocientista da Harvard Medical School, em Charlestown, Massachusetts.
É necessário mais investigações para testar se o mecanismo de aliviar a dor funciona não só em ratos anestesiados, mas também em seres humanos acordados. “Se isto realmente funciona em seres humanos, não tenho idéia,” diz Vitaly Napadow. “Mas acho que é um primeiro passo muito importante.”
Outros efeitos da acupuntura
Muitos estudos em animais e humanos têm demonstrado que a acupuntura pode causar múltiplas respostas biológicas.
Estas respostas podem ocorrer localmente, ou seja, no local ou próximo à aplicação, e também a distância, sendo mediada principalmente pelos neurônios sensoriais periféricos, que enviam sinais para diversas estruturas do sistema nervoso central. Isso pode levar a ativação de vias que afetam vários sistemas fisiológicos cerebrais e periféricos.
Um foco de atenção nos estudos tem sido o papel dos opióides endógenos (como a dinorfina) na analgesia pela acupuntura.
Evidências consideráveis de estudos básicos em modelos animais vêm demonstrando que peptídeos opióides endógenos são liberados após a inserção das agulhas de acupuntura, e que pelo menos parte do efeito da acupuntura pode ser explicado por esse mecanismo.
As pesquisas também puderam comprovar este efeito pois o uso de antagonistas de opióides como a naloxona pode bloquear o efeito analgésico da acupuntura, reforçando ainda mais esta hipótese.
Estimulação por acupuntura também pode ativar o hipotálamo e a hipófise, resultando em um amplo espectro de efeitos sistêmicos.
Alterações na secreção de neurotransmissores e neurohormônios e alterações na regulação do fluxo sanguíneo, tanto centralmente como perifericamente, foram também documentadas em pesquisas.
Há também evidências que existem alterações nas funções imunes, produzidas pela acupuntura.